quinta-feira, 5 de fevereiro de 2015

CODEPENDÊNCIA, O QUE É?

“Não é fácil encontrar a felicidade em nós mesmos, mas é impossível encontrá-la em outro lugar”. (Agnes Repplier).

Embora a palavra codependência tenha seu surgimento datado em 1979, já era uma realidade há muito mais tempo presente na vida de inúmeras pessoas. Porém, somente algum depois foi-se nomear este tipo de comportamento bastante comum em familiares de pessoas acometidas pela dependência química.

Obviamente olharemos para a codependência dentro desta realidade da drogadição, mas faz-se importante ressaltar que não é um comportamento exclusivo de pessoas próximas a usuários de álcool e outras drogas. A codependência é um comportamento que se estabelece em inúmeras relações interpessoais.

A medida em que os especialistas começaram a entender melhor sobre este assunto, mais pessoas pareciam possuí-la: filhos adultos de alcoolicos, pessoas que se relacionavam com outras mentalmente perturbadas, pessoas em relacionamentos com doentes crônicos, pais de crianças com problemas de comportamentos, pessoas em relacionamento com  outras pessoas com comportamento irresponsável, enfermeiros, assistentes sociais e outros profissionais que ajudam outras pessoas. Até mesmo alcoólicos e dependentes químicos em recuperação perceberam que eles mesmos eram codependentes e talvez fossem muito antes de se tornarem dependentes químicos.

Mas, afinal? Qual a definição exata de codependência?

Bom, se entendermos a dependência química como ser dependente (psicológica e/ou fisicamente) de álcool e/ou outras drogas a codependência pode ser entendida como ser um parceiro na dependência.

Robert Subby, em seu livro, escreveu uma definição exata do que se entende por codependencia: “Uma condição emocional, psicológica e comportamental que se desenvolve como resultado da exposição prolongada de um indivíduo a – e à prática de – um conjunto de regras opressivas que evitam a manifestação aberta de sentimentos e a discussão direta de problemas pessoais e interpessoais”.

O fato é que existe um denominador razoavelmente comum para codependencia: ter um relacionamento pessoal ou profissional com pessoas perturbadas, carentes ou dependentes. Outro denominador comum mais frequente e observado na dinâmica familiar de dependentes químicos são as regras silenciosas e não escritas que se estabelecem e ditam o ritmo dos relacionamentos. Tais regras PROIBEM a discussão de problemas, a expressão aberta de sentimentos, a comunicação honesta e direta, as expectativas realistas, o egoísmo, a vulnerabilidade, a imperfeição, confiar em outras pessoas e em si mesmo, brincar e divertir-se.

De modo geral, o que se pode observar é que o codependente (na realidade que nos interessa) muitas vezes dá lugar para o dependente ser dependente de álcool e/ou outras drogas dentro da dinâmica familiar. Por isto, se faz tão pertinente que as famílias sejam acompanhadas e recebam a devida atenção e monitoramento quando seu ente está em tratamento. O codependente pode ser facilmente identificado nesta família e receber as orientações necessárias, pois seu padrão de comportamento também lhe gera dor e sofrimento.

quarta-feira, 4 de fevereiro de 2015

Maconha aumenta o risco de psicose

Pessoas que consumiram maconha na adolescência ou no início da vida adulta enfrentam maior risco de apresentar sintomas de psciose mais tarde, afirma um estudo recém-divulgado.


A pesquisa, realizada pelo professor Jim van Os, da Universidade de Maastricht, da Holanda, foi feita na Alemanha, e contou ainda com pesquisadores da Suíça e da Grã-Bretanha. A psicose é uma desordem mental na qual o indivíduo perde o contato com a realidade. O estudo, publicado na revista especializada British Medical Journal, acompanhou um total de 1.923 pessoas ao longo de um período de dez anos. Apesar de as relações entre maconha e psicose já serem conhecidas, ainda não estava claro se era a maconha que desencadeava os sintomas dessa condição ou se as pessoas se sentem propensas a consumir a droga devido a seus sintomas. A pesquisa indica que a primeira hipótese é a mais provável.

Estudo

Os participantes da pesquisa tinham entre 14 e 24 anos. Eles foram avaliados em períodos distintos para aferir possíveis relações entre o uso de maconha e de manifestações de sintomas psicóticos.

O primeiro período estudado foi feito três anos após o início da pesquisa. A segunda amostragem ocorreu oito anos depois que a pesquisa começou. E a conclusão ocorreu dez anos após o começo do estudo.

Os pesquisadores colocaram os que já fumavam maconha em um grupo e excluíram os que apresentavam um quadro pré-existente de psicose, para que pudessem melhor estabelecer as ligações entre novos usuários de maconha e a apresentação de sintomas da doença.

A pesquisa também teria mostrado que aqueles que já fumavam maconha na época do começo da pesquisa enfrentariam riscos mais elevados de apresentar sintomas psicóticos persistentes.

Aumento

O estudo concluiu que o uso de maconha aumenta ”significativamente” a incidência de sintomas psicóticos, mesmo quando outros fatores, como situação sócio-econômica, o uso de outras drogas e de condições psiquiátricas estão em jogo.

Além de afirmarem que o uso da maconha é um fator de risco para o desenvolvimento de sintomas psicóticos, os cientistas envolvidos com a pesquisa disseram também que ”o uso repetido de maconha pode aumentar o risco de sofrer desordens psicóticas por ter impacto na persistência dos sintomas”.

De acordo com Robin Murray, professor de pesquisa psiquiátrica do Instituto de Psiquiatria da Grã-Bretanha, a pesquisa representa ”mais um tijolo no muro de provas”, de que o uso da maconha contribui para formas de psicoses como a esquizofrenia. Segundo Murray, a pesquisa é um dos dez estudos similares que apontam nessa mesma direção.

O direito de não usar drogas

Ronaldo Laranjeira, professor titular de Psiquiatria da Unifesp, é coordenador do Instituto Nacional de Políticas do Álcool e Drogas (Inpad) do CNPq

Recentemente, divulgou-se a opinião sobre o futuro da política de drogas no Brasil do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso, que defende maior liberdade de uso da maconha. Fernando Henrique disse que um mundo sem drogas é inimaginável, expressando a visão da Comissão Brasileira sobre Drogas e Democracia. Ao alegar que a sociedade conviverá sempre com as drogas, defende com uma clara distorção da racionalidade a ideia de que isso deveria tornar os usuários imunes ao sistema criminal. Teríamos uma inovação na área dos direitos humanos, na qual todos nós deveríamos ter o direito de continuar usando drogas ilícitas, independentemente das consequências negativas para o indivíduo e para a sociedade. Por essa visão, seria um abuso dos direitos individuais qualquer constrangimento ao uso de drogas.
No Brasil, a lei que regula o consumo de substâncias (Lei nº 11.343/2006) trouxe mudanças significativas, com menor rigor penal para o usuário. Ainda não se sabe se produziu alguma diminuição do consumo de drogas. Todas as evidências indicam o contrário. Em relação à maconha e à cocaína, somos um dos poucos países do mundo onde o consumo está aumentando. No mínimo, essa nova lei não impediu esse aumento. Estamos com maior liberdade para usar drogas, mas os usuários continuam tão desinformados e desassistidos de tratamento quanto antes.
A defesa do direito ao uso de drogas é uma visão por demais simplista e não leva em consideração a complexidade do uso de substâncias, em particular as modificações que o uso de drogas provoca no sistema nervoso central. Parte-se do princípio de que todos os usuários de drogas teriam plenas capacidades de decidir sobre o seu consumo. Não podemos afirmar que todos os que usam drogas estejam comprometidos quanto ao seu julgamento, mas podemos argumentar que uma parte significativa dos usuários apresenta diminuição de sua capacidade de tomar decisões.
As drogas que produzem dependência alteram a capacidade de escolher quando, quanto e onde usar. É ilusório pensar que um dependente químico tenha total liberdade sobre o seu comportamento e possa decidir plenamente sobre a interrupção do uso. É por isso que os dependentes persistem no comportamento, com grandes prejuízos individuais, para sua família e para a sociedade.
Se, por um lado, a opinião de Fernando Henrique carece de legitimidade com relação aos direitos humanos básicos, pois não existe um direito ao uso de drogas ilícitas, por outro, temos aspectos do debate que não foram mencionados. Por exemplo: existe uma relação entre saúde e direitos humanos. As Nações Unidas e a Organização Mundial da Saúde desenvolveram recentemente o conceito de que todos deveriam ter o direito ao mais alto padrão de saúde possível (right to the highest attainable standard of health). É um conceito relativamente novo, com não mais de dez anos. Afasta-se de declarações vagas sobre saúde e responsabiliza a sociedade e o sistema de saúde pela implementação de políticas que garantam a qualidade dos cuidados.
Recentemente o Estado de São Paulo deu um bom exemplo de garantia do mais alto padrão de saúde possível ao proibir o fumo em todos os ambientes fechados. O que se garantiu nessa nova lei não foi o direito de fumar, mas o direito de a maioria da população ser preservada do dano da fumaça. Mesmo os fumantes têm o seu direito a um mais alto padrão de saúde garantido ao ser estimulado a fumar menos. Esse foi um exemplo de como é possível termos intervenções governamentais que preservem o direito à saúde e ao mesmo tempo sinalizem uma intolerância ao consumo de uma droga que mata um número substancial de cidadãos.
Experiências de sucesso em outros países apontam na direção de combinar estratégias, do setor de Justiça com o setor educacional e de saúde, para que se obtenham melhores resultados. Leis que sejam respeitadas e fiscalizadas tendo como objetivo o bem comum. A Lei Seca, que proíbe o beber e dirigir, identifica o indivíduo e impõe sanções, também pode ser um exemplo, pelo número de vidas salvas até o momento. O fato de se criar uma intolerância com o fumar ou com o beber e dirigir em nenhum momento produziu desrespeito aos cidadãos que fumam ou bebem.
No Brasil não temos uma política de prevenção do uso de drogas. Deixamos os milhões de crianças e adolescentes absolutamente sem nenhum tipo de orientação sobre prevenção do uso de substâncias. Fornecemos muito mais informações sobre o meio ambiente do que com os cuidados de saúde. Temos uma boa política de prevenção ambiental, mas não temos com relação às drogas. Não temos um sistema de tratamento compatível com a magnitude do problema, deixando milhares de usuários completamente desassistidos.
O tema proposto por Fernando Henrique Cardoso é importante, traz a oportunidade de debatermos que tipo de política construir para a próxima geração. Queremos uma sociedade em que o uso de drogas seja um direito adquirido? Ou queremos uma sociedade muito mais ativa, em que o sistema de Justiça funcione em sintonia com os sistemas de saúde e educacional e possamos criar ações baseadas em evidências científicas para diminuir o custo social das drogas?
Talvez um mundo sem drogas jamais exista. Como também não existirá um mundo sem crimes ambientais ou sem violações dos direitos humanos. Isso, no entanto, não é desculpa para descartar o ideal e continuar a lutar pelo objetivo de um mundo melhor. Tolerar as drogas, banalizar o seu consumo não é a melhor opção para uma sociedade que valorize a saúde e os melhores valores de respeito à dignidade humana.